EMPRESA É A ESCOLA

 Qual é o objetivo e o impacto da educação corporativa na carreira dos profissionais hoje? Veja o que tem a dizer a maior especialista da atualidade nesse assunto

Sabe aquela história de se formar na universidade, conseguir trabalho numa empresa e participar de um ou outro treinamento de vez em quando? Esqueça. Para um número cada vez maior de companhias, isso já não basta. Afinal, o ritmo vertiginoso das mudanças torna o conhecimento obsoleto num piscar de olhos. O fundamental, agora, é garantir aos funcionários uma estrutura de ensino permanente, o tempo todo, na qual aprendam coisas úteis, que possam ser aplicadas no dia-a-dia do trabalho. Para isso, mais de 2.000 empresas nos Estados Unidos – entre elas General Motors, Xerox, Disney e Motorola – já criaram suas próprias universidades. E, ao que tudo indica, o Brasil está seguindo o mesmo caminho. Brahma, Accor, Algar, BankBoston, entre outras, também têm a sua.
Jeanne Meister, presidente da Corporate University Xchange, Inc., empresa de consultoria em educação corporativa com sede em Nova York, acompanha de perto esse crescente movimento. Considerada hoje o principal nome mundial em universidade corporativa, ela é a conferencista mais requisitada internacionalmente para assuntos relacionados à educação. Autora do livro Educação Corporativa (Editora Makron Books), há anos vem pesquisando continuamente as melhores práticas de aprendizado e desenvolvimento. Em outubro, Jeanne lança nos Estados Unidos seu segundo livro sobre o assunto: Learning from the CEO: How Chief Executive Officrs Shape Corporate Education (Aprendendo com os CEOs: como os Presidentes dão Forma à Educação Corporativa). Simpática, articulada e precisa, Jeanne concedeu a seguinte entrevista a VOCÊ s.ª no hotel em que se hospedou em São Paulo, durante recente visita à cidade.

O que é e qual o objetivo de uma universidade corporativa?

            A universidade corporativa – também conhecida como faculdade, academia ou instituto de aprendizagem – nada mais é do que uma unidade educativa dentro das organizações. Sua missão é treinar e garantir o aprendizado contínuo de toda a sua cadeia de valor, ou seja, funcionários, clientes e fornecedores. O objetivo é que todos passem a Ter as qualificações necessárias para atender as metas da organização, colaborando assim para o seu sucesso.

Qual é a importância das universidades corporativas para o currículo do profissional?

           
Muitas oferecem certificados e diplomas que, além de representar um tremendo diferencial no mercado, têm um peso considerável no currículo.

Com as universidades corporativas, os funcionários passam a Ter uma visão mais global dos negócios?

            Sim. Proporcionar aos funcionários um conhecimento do contexto no qual a empresa opera é um de seus objetivos. Já existem cursos que explicam quem são seus clientes, fornecedores e concorrentes, quais as melhores práticas de outras empresas e coisas do gênero. Essa referência contextual garante uma visão geral     da estrutura da companhia e ajuda as pessoas a compreender melhor seu papel.

Qual o impacto das universidades na carreira dos profissionais?

            Elas permitem que o funcionário administre de forma proativa seu próprio desenvolvimento profissional. Ou seja, uma vez de seguir passivamente um programa elaborado pelo seu gerente, ele mesmo sugere o tipo de treinamento que precisa. Além disso, dentro desse sistema são oferecidas oportunidades incríveis de aprimoramento. Há desde aulas de inglês até cursos de MBA.

De que maneira essa iniciativa das empresas pode ajudá-las a atrair e reter talentos?

            Oferecendo aos funcionários os melhores programas de treinamento e a possibilidade de renovar seus conhecimentos e suas habilidades, algo fundamental nos dias de hoje. Hoje, há uma enorme competição por talentos e as companhias consideram as universidades corporativas um atrativo importante, um diferencial. Por isso, muitas vêm se esforçando para destacá-las em seus relatórios anuais.

As universidades corporativas representam uma ameaça às universidades tradicionais?

            Na verdade, elas representam uma oportunidade e uma ameaça ao mesmo tempo. Oportunidade porque as universidades tradicionais podem tornar-se parceiras das empresas, criando programas de ensino únicos e diferenciados. A ameaça é que as unidades corporativas, graças à atualização constante de seus cursos, podem acabar alterando o sistema de educação no futuro. Em outras palavras: o exemplo, passem a oferecer um diploma de e-com-merce e se transformem simplesmente no melhor lugar para aprender sobre esse assunto.

Os programas de MBA também estão em xeque?

            Não. Na verdade as escolas não fazem tanto dinheiro com os cursos de MBA. A principal fonte de renda de universidades como Michigan, Havard, Stanford, etc., são os programas de extensão para executivos – aqueles mais curtos. Hoje, Ter um diploma de MBA continua sendo um diferencial importante para os profissionais. O que vem acontecendo muito, no entanto, é a contratação de professores de MBA pelas empresas. Muitas preferam isso a mandar seu pessoal para as universidades.

Os executivos das empresas também estão sendo recrutados para dar uma força na educação?

            Sim. Há cinco anos, se você perguntasse às empresas quem eram os membros do seu corpo docente, elas responderiam que era basicamente o pessoal da área de treinamento. Hoje, a tendência é que os líderes internos assumam cada vez mais essa tarefa. A idéia é fazê-los transmitir sua experiência aos demais e aumentar sua participação e seu envolvimento na educação interna.
Até que ponto o comprometimento dos altos executivos é importante para o sucesso da educação corporativa?

            O apoio da alta cúpula é essencial à evolução do ensino e para a mudança cultural dentro das empresas. Os CEOs vêm desempenhando cada vez mais o papel "diretores de aprendizagem", investindo uma parcela significativa de seu tempo nessa tarefa. Esse envolvimento engloba participar de workshops, orientar os novos funcionários em relação aos valores e visão da organização e facilitar os programas de liderança dos gerentes de nível superior. O meu próximo livro, a ser lançado em outubro nos Estados Unidos, fala exatamente sobre isso. Nele, estão destacadas 50 universidades corporativas americanas e o depoimento de sete CEOs bastante atuantes na área de educação.

E aonde a educação a distância entra nessa história?

          
Pode-se dizer que é uma das protagonistas. A tecnologia vem sendo utilizada de uma maneira cada vez mais agressiva para acelerar o aprendizado dos funcionários. A vantagem é que as pessoas conseguem concluir os cursos no momento em que esse conhecimento é necessário. E, numa economia em que as condições dos negócios mudam num ritmo tão frenético, esse fator é vital para obter-se vantagem competitiva no mercado global. À medida que novos conhecimentos são disseminados cada vez mais rápido dentro das empresas, sobretudo por causa da Internet, as pessoas esperam o mesmo nível de personalização no que diz respeito ao treinamento.

As universidades corporativas investem mais no desenvolvimento de habilidades pessoais ou técnicas?

           
Nos últimos anos, o foco tem sido sobretudo no desenvolvimento das competências pessoais – como liderança, senso de equipe, delegação de poderes etc. De uns tempos para cá, porém, creio que está havendo um equilíbrio maior das duas coisas.

Quando surgiram as universidades corporativas e por quê?

           
Elas começaram a aparecer no final da década de 80 porque as empresas se deram conta de que não podiam mais depender das instituições de ensino superior para desenvolver sua força de trabalho. Decidiram, então, assumir o papel proativo no desenvolvimento de sistemas educacionais e vinculá-los de maneira mais estreita àsmetas empresariais.

Entrar no setor de educação é uma maneira de as empresas assegurarem sua sobrevivência no futuro?

            Certamente. Afinal de contas, para prosperar num ambiente global em constante transformação, é necessário que o modo de pensar seja compartilhado por todos os funcionários. A idéia é que todos caminhem numa só direção, algo vital para o sucesso a longo prazo de qualquer empresa.


Qual a diferença entre a universidade corporativa e o departamento de treinamento?

            A função da área de treinamento é simplesmente treinar as pessoas para desenvolver suas habilidades para o trabalho. Tende a ser mais descentralizada e com vários programas abertos. As universidades corporativas, por sua vez, funcionam de forma mais centralizada e têm um escopo bem mais amplo. Sua proposta é alinhar todos os envolvidos na organização aos objetivos empresariais, além de oferecer soluções de aprendizagem com relevância estratégica para cada família de cargos.

Existem outras diferenças?

            Sim. O departamento de treinamento é um centro de custos. As universidades corporativas, ao contrário, estão se tornando cada vez mais um centro de resultados, e até de lucro. Muita atingem um tal nível de excelência que são capazes de se desligar da empresa-mãe, aceitar gente de fora e até vender e licenciar seus programas. O First Union, o sexto maior banco dos Estados Unidos, por exemplo, recentemente começou a vender seus programas de treinamento para outros bancos americanos.

A tendência é que praticamente todas as grandes companhias tenham sua própria universidade?

            Eu diria mais do que isso. Acreditamos que num futuro bem próximo cada uma das 500 maiores empresas da Fortune terá seu próprio centro de educação. Hoje, 40% já têm um.

Somente as grandes empresas podem se dar ao luxo de Ter um centro de ensino?

            Não exatamente. As grandes predominam, é claro, uma vez que é preciso dinheiro para investir. Mas nada impede que as pequenas também criem suas universidades – as menores que conheço têm cerca de 500 funcionários.

Em geral, o sistema de ensino das universidades tradicionais depende de uma estrutura física. Isso também se aplica às universidades corporativas?

            Costumo dizer que a universidade corporativa não é um lugar, mas sim um processo. Muito embora a palavra universidade nos leve a pensar num campus físico e num corpo docente estável, a versão corporativa é diferente, mais inovadora. O foco do treinamento não está necessariamente na sala de aula. Está, sim, na criação de uma cultura de aprendizagem contínua, em que os funcionários aprendem uns com os outros e compartilham as inovações e as melhores práticas com o objetivo de solucionar problemas empresariais reais.


 Fonte: Revista VOCÊ s.a.  -  Autor: Leticia Colombini     

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